Ontem, decidi mudar a água às minhas porcas - por porcas leiam-se as minhas ricas tartarugas, que deviam era de estar a hibernar, mas não, a vida delas é tãããão emocionante (sim, controlar o que eu faço na cozinha ou passar o dia inteiro ao sol ou matar as moscas de tédio ou até a olhar fixamente para o cortinado a ver quem se mexe primeiro é de uma azáfama pegada) que nem hibernam. O ritual normal, escaldar tudo, esfregar com a esponja o que é preciso, inclusivamente as suas carapaças.
Pego na minha mais pequena: o brain das duas... Salsaparrilha (nome científico Salsilhitasparrillum pestitis de casquiti piquinitium), mas somente é chamada assim para o veterinário (só uso o nome verdadeiro dela quando ela está a fugir desalmadamente pelo estofo do Peixmobil acima, numa tentativa vã de a assustar, nunca com sucesso que é uma descarada, a porca, arraçadíssima de tartaruga ninja). Criatura de olhos brancos (que mais parecem dois faróis) carinhosamente chamada de Salsitas por mim. Pego eu no meu garboso espécime Salsilhitasparrillum pestitis de casquiti piquinitium, resmungo com ela, que não pára quieta, mal me deixa esfregar-lhe a casca e muito menos a barriga para lhe limpar possíveis alguedos. Depois de algum esforço - meu e dela - despachada. Vá, charco. Chega a vez da maior... a pasmaceira em forma de bicho, com um ar de frete inigualável: Pistáchio. (não, não estou a pedir um pires ó senhor! Se bem que umas alcagoitas marchavam). De nome científico Pistachium vaium te catarum e naum me tapeitis o solium. Criatura que se farta de enfardar, principalmente se for cenoura aos bocadinhos. Têm um especial fetiche por tudo o que é laranja precisamente por causa da cenoura (a minha cozinha é em tons laranja, imaginem as vezes que ela ja tentou morder o cortinado... -.-). Esta sim, está uma bizarma... já quase maior que a minha mão. Felizmente pacata, fica serena a olhar para mim quando falo com ela (ou abismada) bem ao contrário da Salsitas que quer é dar o baza como se não houvesse amanhã. Começo eu a fazer as minhas figuras ainda mais tristes, ao pegar nela:
- Estamos tão grandes e lindaaaaaas. Er.. tira lá o lindas que estás mesmo a precisar de uma esfregadela nessa cascaria imunda, fosga-se Pistáchio. - vai de esfregar-lhe a casca e dela se agarrar a minha mão, sem tentar fugir - Mas estamos tão grandeeeeeees quem diria minha porquinhaaaaaa, quando te comprei tinhas uns míseros 30 a 40 mm de diâmetro e olha agora para tiiii... - vira-a ao contrário - quase que te deixo cair, mas não te preocupes a dona não te largaaaa e blá blá blá blá e blá blá blá... - Por momentos calei-me. Sei lá, milagre, chamem-lhe o que quiserem. Oiço na casa-de-banho dos vizinhos de cima a água a correr na banheira, a voz da mãe para a filhota pequena, com ternura e miminho na voz a falar com a filha. Possivelmente a dar-lhe banhinho... como eu às tartarugas.
PÁRA TUDO. E parou mesmo, a Pistáchio ficou à espera que eu lhe continuasse a esfregar a casca e a passá-la por debaixo de água. Deu-se uma epifânia nesta cabecinha... OMG! Sim... realizei a minha vida. Imaginei alguém a ver a minha vida como se fosse um filme, representada por um corte vertical no edifício onde mostraria o interior de cada apartamento ao longo do edifício, e mostrava as vidas a decorrerem dentro de cada um. Naturalmente, iria focar-se no meu (claro olha, então mas a história não é sobre mim??)... e iria abranger também o apartamento de cima. E começa o filme: E tal... uma visualização geral de todos os apartamentos, uns na cozinha a lavarem os tachos... outros na sala a gritarem - ou não - pelo SLB... Outros no quarto a fazerem não sei o quê porque não se percebe que as luzes estão desligadas... um ou outro na sua vida socialmente activa no facebook até que... ah-ah! Casa da Peixa. Piso de cima: Mãe e filha na casa-de-banho. Piso de baixo: Eu na casa-de-banho a lavar o aquário das tartarugas. Piso de cima: mãe a falar com a filha carinhosamente, como ela é linda e fofinha e os olhos da mãe. Piso de baixo: eu a esfregar a casca das tartarugas e a dizer-lhes mimosamente que estão grandes que nem porcas, que são umas fofinhas para a dona.
Enquanto umas dão banho às filhotas e as mimam, dizendo-lhes que as adoram... outras limpam e esfregam as cascas das tartarugas e dizem-lhes igualmente que as adoram...
... (pausa. silêncio. suspiro. risota torcista)
Como disse hoje a uma amiga, começo a sentir-me uma espécie de "velha dos gatos", mas invés de gatos - que me fazem alergia by the way - sou a moçoila das tartarugas e dos aquários. Oh santa pachorra! :)