Desafio Caixa dos Lápis de Cor | #10 Verde Claro
Há uma coisa que nós dizemos muito na família, em tom de sarcasmo e brincadeira, aquando determinadas situações se dão, que é "Tinha os zólhinhos tão lindus, que máis parexiam duas poxinhas de áuga". Não me perguntem o porquê, mas associo sempre ao lado menos belo da situação: invés de uns olhos lindos e maravilhosos, brilhantes e vivos, imagino uma poça de água lamacenta, turva, daquelas que até podem ter girinos ou umas coisas manhosas por lá a nadar de costas. É assim, o imaginário de cada um, funciona efectivamente à sua maneira, não é? Se bem que têm a sua magia, uma póxinha de áuga repleta de girinos ou de alguinhas verdinhas, a ondularem. Enfeitiça. Por mim falo, claro, pois tal como me acontece com as teias de aranha, quero lá ir meter o dedo. E quero lá bem saber se lá está a aranha - dá pica extra - ou se há bichezas debaixo do lodo. É uma força que se apodera de mim. Inexplicável.
Pocinhas, girinos, lamas e cenaices aparte, a mim acontece-me sempre alguma coisa. É dito e sabido a minha atracção fatal por poças de lama, lagos de água turva cheia de bicheza duvidosa cristalina, ser um magneto para o que quer que seja líquido e esta vivência já me acompanha desde que eu tenho memória - sou Peixa. Não esperem uma memória muito longa - Eu nunca fui criança de vestir muitas saias e essas coisas. Andava muito mais de calções ou calças de ganga. A mãe Peixa, naturalmente, gostava de me empindiricar toda aquando havia jantares ou festas de aniversário. Eu, com o meu ar angelical, ficava sempre uma criatura toda mimosa e a parecer de porcelana - só por fora, que por dentro ai Jesus, não fujas não - principalmente no dia em que ela me decidiu vestir com uma porra de uma saia branquinha como a cal, cheia de preguinhas e mariquices. A sério. Parecia mesmo sei lá o quê. Se por si só o médico, aquando eu era bébé, já perguntava aos meus pais se eles saiam comigo à rua, tal o meu bronze imaculado a lixívia, imaginem eu, loira, olho claro, branca como a alforreca, vestida de branco. Medo, muito medo. Parecia um fantasma. Não sei que lhe deu na cabeça. Bem, tudo começa logo mal quando uma mãe se lembra de vestir assim uma criança mas principalmente quando diz a um filho: "Cuidado! Podes brincar mas não te sujes!!" e assim se dita o destino. Eu a brincar até me portei bem. Tentei não amarrotar a saia panisga, não me encostar assim a nada e até cuidado ao respirar tive, não fosse eu exalar e amarrotar uma preguinha. A mãe Peixa chega ao pé de mim e diz-me: "Peixinha filha, queres um geladinho?" Ora... perguntar ao cego se quer ver?! Pois está claro. E ainda tive direito a escolher gelado. Eu adoro sabores cítricos e então escolhi o calipo de limão. "Cuidado filha, não te sujes". Bem dito, bem certo. Foi a mãe Peixa sair do raio de visão periférica, eu sossegada a ratar o gelado... como sabem, o calipo derrete... fica sumo no fundo... Aqui a criatura tenrinha vai de elevar a embalagem do gelado e... miss saia manchada de calipo verde! Ah pois é!! Suspirei a pensar que ia levar nas orelhas. Reflecti que se calhar como era verde claro, talvez aquilo saísse bem da saia, que se fosse o de morango ou de coca cola, aí a mãe me estrafegava. A verdade verdadinha foi que quando me mostrei à mãe Peixa, ela refilou... mais docemente do que eu esperava. "Ai Peixinha, essas nódoas são tão difíceis de tirar, filha!" Olha, temos pena. Não tivesses dado gelado à criança. Qual foi o desfecho? Nunca mais vesti aquela saia. Seja porque era branca, seja porque era um imãn para as nódoas e raios que a partam, seja porque o raio da nódoa do calipo, embora disfarçada, nunca mais saiu daquele tecido.
Escusado será dizer, que chorei baba e ranho, fiz birra, amuei, greve de fome e ainda não comi nunca mais gelado calipo de limão, por causa de nunca mais ter vestido a saia e dado ao episódio traumático, que ainda hoje lateja na minha alma!! #sóquenão
Há mesmo males que vêem para bem, possa!!! Deus é grande!! Ver a saia pelas costas, foi das melhores sensações que eu podia ter tido! Mas... Rei morto, rei posto, não tardou muito... Vivaaaa
Neste desafio participo eu, a Concha, a A 3ª Face, a Maria Araújo, a Fátima Bento, a Imsilva, a Luísa De Sousa, a Maria, a Ana D., a Célia, a Charneca Em Flor, a Gorduchita, a Miss Lollipop, a Ana Mestre, a Ana de Deus, a Cristina Aveiro, a bii yue, o José da Xã, o João-Afonso Machado e a Marquesa de Marvila.
Todas as quartas feiras e durante 12 semanas publicaremos um texto novo inspirado nas cores dos lápis da caixa que dá nome ao desafio. Acompanha-nos nos blogues de cada um ou através da tag "Desafio Caixa de lápis de Cor". Ou então, junta-te a nós ;)