...e que sempre tinha valido a pena tomar o seu banhinho mensal, pentear e pôr perfume.
Inevitavelmente, a minha vida é recheada de eventos e momentos de arrepios-de-vergonha-alheia, quer meus quer dos outros - mais dos outros, tenho o condão de presenciar cada coisa, que ó Senhor (*benzer sinal da cruz*) que me superam aos pontos, vírgulas e parágrafos - mas parece que as manhãs e fins do dia, são especialmente ricos nessas situações, quer seja porque as pessoas ainda estão ao rolentim, não acordaram para a vida e andam meio zombies, a sonharem com a almofada babada que tiveram de deixar em casa, sozinha, entregue aos bichos, pela manhã ou pela tarde, que já têem o cérebro frito, queimado, esturricado, armado em pipocas de microondas, com o modo zombie de cérebro dormente activado - este é diferente do da manhã. O da manhã ainda conserva réstias de inteligência, mas o motor ainda está a arrancar. O da tarde, já deu tudo o que tinha a dar, os olhos da cara, o couro e cabelo, o rabo e mais uns tostões e está mesmo com o botão "survival" e "sa f*da" premido e o piloto automático a tomar conta da situação há muito, estando o crânio vazio e o tico e o teco na esplanada a bebericarem uma imperial e a ratarem uns tremoços e minuins, observando os banhistas a levarem com as ondas no alto da pinha e beberem pirulitos - que tudo agrava, com o lume no cú de irem para casa o mais rápido possível. Eu que o diga, o que vivo na selva que é o trânsito ao fim do dia, com a quantidade de artistas do cinema mudo e as merdices que fazem, só porque estão aflitinhos para se teletransportarem para casa e se assolaparem no sofá, esquecendo que toda a gente têm vida e vontades e não só as amélias destes meninos. Mas adiante, fica tema para outro post.
Ora, há uns dias, logo pela matina, vivi um momento de arrepios-de-vergonha-alheia em primeira mão.
Imaginem estarem duas pessoas na rua, com distâncias de três passos uma da outra, de frente para a estrada e eu apenas conhecia uma. Adivinhem qual? A que estava mais atrás - só podia - Sabem que aconteceu, não é? Vai a Peixa e acena à tal criatura traseira, gritando um "Bom dia!!" pela janela do peixmóbil e eis que acenam ambas as duas criaturas ao mesmo tempo para mim, ambas as duas me desejam os bons dias e o da frente estava assim especialmente com um ar sorridente e estranho à Zé Tonhó das Couves, mega feliz da vida. E eu para mim "Mas quem é aquele artista?". Os arrepios-de-vergonha-alheia funcionam em ambos os sentidos: eu, porque sei lá que ficou o homem a pensar, por uma perfeita estranha lhe acenar daquela maneira e de maneira efusiva. Talvez que não aperto o casaco todo e coitada, não se diz que não aos malucos, deixa lá acenar à moça que ela assim fica feliz e a mim não me cai uma mão, ou dente, ou pé ou cabelo! Além de que pensei que é sempre mau retribuir acenos quando não são para nós. Senti compaixão, ao ir ao baú e recordar todos os meus momentos de arrepios-de-vergonha-alheia, que me passou rápido e pensei "tótó, a usurpar cumprimentos alheios com a maior das caras podres". Acontece a todos, mesmo. Venha lá o maior da aldeia, a ver se não lhe toca a ele também as figuras tristes. E o outro sentido em que funciona, basicamente é unilateral e rotativo, entrou em um sentido de rotunda, entra em contra-mão na mesma estrada que acabou de percorrer, na semelhança da carta de virar de sentidos do Uno, entendem? "Travões ó pessoal, agarrem-se que vamos fazer uma manobra perigosa de mudar de sentido". - isto de funcionar em ambos os sentidos neste caso, é similar como em alguns relacionamentos: só têm um sentido e não bufas. "Ah mas quero lá eu impor a minha opinião, eu respeito a tua maneira de pensar, liberdade...! Maaaas....."
Pois é, pois é. Não sei quem é, de onde vêm, para onde vai, o que come, bebe, enfim... só sei que respira, porque é uma pessoa - acho eu, pode ser um alien ou um robot, sabe-se lá, nos dias que correm nada é o que parece - e tal espécime nunca mais foi visto por estas paragens. Talvez tenha percebido que o cumprimento não era para ele e se esfumou, cavou um buraquito até à China e viveu feliz para sempre em uma gruta, com vista para o interior da terra (que luxo!).
É por estas e por outras, que raramente aceno a alguém: com o filme que a minha vida dava, era certinho como o sol em como não seria para mim, o aceno. Por isso, mais vale estar quieta do que fazer figurinhas - já bastam as normais.